quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Permanências, de Judite Jorge


Permanências, obra de Judite Jorge, nascida em Pontas Negras na ilha do Pico, venceu o prémio “Nunes da Rosa”, do concurso literário Açores/92, promovido pela, então, Secretaria Regional da Educação e Cultura.
            A escrita relata a vivência circular num tempo e num espaço, representando o conformismo de quem se deixa ficar, mas que anseia por partir. Em algumas das personagens, esta atitude coaduna-se com a bruma de muitos dos dias insulares, com todos os “penares” de quem não tem coragem para dar um passo em frente.
            Por vezes, a inquietude esfumaça o ritmo do ilhéu que ambiciosamente sonha com o bulício dos grandes espaços e das dinâmicas citadinas. O anonimato é criticado, mas simultaneamente desejado por quem se sente analisado ao milímetro e acorrentado ao cerco humano do saber, mais do outro do que de si próprio, como se a vida alheia fosse  notícia de dimensão regional.
            Tantas vezes o pensamento leva a personagem à viagem por outras paragens, no entanto, quantas outras e, possivelmente, mais frequentes, são os regressos ao ponto de partida.
            O paradoxo reside, assim, nesse conflito constante entre a necessidade de libertação e o aconchego da rotina e da segurança do que é acolhedor e já conhecido: “Permanece porque não sabe se existe no mundo esse lugar, entre a luz e a obscuridade, sem qualquer palavra, só a respiração dos corpos e o morno arfar das paredes viradas para dentro, onde tudo se orienta para o centro […]” (p.11).
            As idiossincrasias insulares encontram, nas palavras do narrador, reflexos que se transformam através das emoções e se vivem através dos sentidos. Os cheiros, as vivências, as rotinas pitorescas das figuras e dos lugares rurais, ou talvez da imagem de uma ruralidade citadina… diferenças e semelhanças que não encontram um elemento de separação ou de limite questionável.
            A personagem Júlia (re)conhece todos esses elementos, sente-os e vive as circunstâncias de um tempo específico. A transmissão de saberes, “as frases tiradas dos livros da biblioteca itinerante” (acontecimento marcante na vida de tantos ilhéus, e não só!), a comunicação interpessoal, a que é realizada frente a frente no confronto real das relações humanas, fazem parte do quotidiano de Júlia, numa época em que não se imaginava o espaço virtual senão no sonho, ou numa qualquer aventura de ficção científica.
            O núcleo desta narrativa de vida enaltece a constituição, o crescimento e a descoberta de uma personalidade repleta de convicções, de alguém que sabe o que quer e que luta pelos seus ideais, na procura do seu “norte”.
O mar, esse mar imenso, é metáfora da memória, da viagem e da ambicionada distância para quem é da ilha. Porém, o que será uma ilha para um forasteiro, para um habitante de um continente sem fim? Essa é afinal a grande descoberta de António.
Haverá uma ilha em cada um de nós?

Paula Cotter Cabral

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